Podemos entender cidadania como o ato de comprometer-se com os valores universais da Liberdade e da Vida condicionados pela Igualdade. Este compromisso implica em reconhecer a humanidade como grupo social e considerar as relações humanas como relações de reciprocidade.

A cidadania pressupõe o desenvolvimento de valores éticos que se objetivam nas seguintes virtudes cívicas: solidariedade, tolerância, justiça e valentia cívica, engendradas na relação da vida pública e vida privada. A legitimidade social destas virtudes significa a constituição de cidadãos que apóiam a construção de um mundo sócio político mais justo, onde a dominação e a submissão sejam superadas.

Cidadão é aquele que luta para que todos sejam cidadãos, é aquele que participa, que conquista a autonomia, que não é tutelado e que não é invisível perante a sociedade. No Brasil, como em vários outros países do mundo, as pessoas idosas têm grande dificuldade para exercer sua cidadania e, portanto, é comum que na etapa da velhice exista um processo de expropriação de identidade social.

No caso específico do idoso a dimensão de autonomia e consequentemente, o exercício da cidadania, dependem da criação de condições favoráveis à manutenção de seu poder de decisão, escolha e deliberação. Tais condições somente serão efetivadas quando a sociedade perceber que precisa mudar seu comportamento em relação ao envelhecimento. E para que isto ocorra precisamos afastar os estereótipos culturalmente construídos.

Para a identidade social do idoso brasileiro, a imagem é uma construção cultural muito importante. A forma com que ilustramos pessoas, raças ou classes etárias contribui sobremaneira para a posição social que queremos

ocupar. Assim existem longas lutas contra os estereótipos. E vale explicar que estereótipo tem origem no verbo estereotipar, que significa, tornar fixo, inalterável. Ou seja, lutamos, na área do envelhecimento, contra aquela imagem do idoso decrépito, velho, alquebrado e cambaleante. Esta, certamente não é a imagem adequada para ilustrar ou referir aquele que envelhece.

A imagem e a identidade são elementos tão importantes que o Estatuto do

Idoso conceituou no artigo 10, parágrafo 2o, que o direito ao respeito abrange, além da questão da integridade física, psíquica e moral, a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, de valores, idéias e crenças, dos espaços e dos objetos pessoais dos idosos.

Estamos construindo uma identidade social para o idoso brasileiro, e muito do sucesso desta construção depende de como a sociedade encara e visualiza o idoso. De como ela o identifica. Se nos baseamos em uma ilustração de uma idosa sentada em uma cadeira de balanço fazendo tricô ou de um idoso de suspensórios, cabelos branquinhos cochilando ou babando enquanto a vida passa, estamos forjando uma cena equivocada (pois nem todos os idosos são assim) e consequentemente, uma identidade social cheia de preconceito.

É claro que existem idosos exatamente como os que desenhei e podem ser felizes assim. O problema está em fixar o idoso nestes moldes, ou seja, nesta imagem. Existem idosos de todo tipo, existem velhices plurais e todas são personalíssimas. Gilberto Gil é idoso, Caetano Veloso é idoso, Abílio Diniz é idoso. O idoso pode ser aposentado, ou pode trabalhar. Pode ser casado, viúvo, homossexual ou heterossexual. Pode ser pobre ou rico, simpático ou sisudo. Ativo ou sedentário, saudável ou doente. O erro está em estereotipar o idoso como doente, incapaz e dependente.

Ninguém gosta de ser tachado de absolutamente nada. A idéia de que todo gordinho tem que ser hilário, de que toda pessoa bonita tem que ser burra, ou de que todo feio tem que ser inteligentíssimo ou supersimpático ou ainda de

que todo cientista tem que ser louco e ter cabelos como os de Albert Einstein, pode demonstrar bem a seriedade e a gravidade de uma imagem social distorcida.

O direito a uma identidade social que tenha visibilidade pode ser muito beneficiado pela construção de uma imagem digna. No Brasil, é vital que a pessoa idosa seja realmente respeitada por toda a sociedade e principalmente que sua identidade-cidadã seja construída sem caricaturas.

É preciso garantir que o idoso seja reconhecido como ente social. A pessoa idosa tem sua biografia. Envelhecer é um direito personalíssimo! Não existe fórmula, padrão ou protocolos pré-definidos. Cada um envelhece de uma forma e ao seu próprio tempo. Precisamos aprender a lidar com o envelhecimento e com sua característica mais importante: a diversidade!!

Portanto, a manutenção da cidadania (enquanto condição de pessoa que, como membro de um Estado, se acha no gozo de direitos que lhe permitem participar da vida em sociedade) é fundamental para a preservação da imagem digna e da identidade social do idoso brasileiro.

A longevidade brasileira é uma realidade que requer preparo da nação para identificar e atender as demandas decorrentes do envelhecimento. A pessoa idosa deve ser valorizada precipuamente como cidadã e sujeito de direitos/deveres, merecendo, antes de tudo, visibilidade, respeito e proteção de sua imagem e de suas vulnerabilidades.